quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

Cabelos vermelhos

Eu achei que pintando meu cabelo fosse me sentir mais feliz. Não fui ingênua a ponto de achar que uma coloração capilar fosse me deixar em estado de êxtase, mas sinceramente esperava sentir no coração algum tipo de felicidade. No mínimo um contentamento, como aquele que sinto ao terminar um livro de 800 páginas cujo autor o tempo todo insiste em escrever na ordem indireta.

Fiquei ruiva, mas não fiquei mais feliz.

Segundo minha mãe, isso mostra que sou uma pessoa que pouco liga para as aparências e que me preencho com questões mais profundas que as mundanas alterações estéticas femininas. (E que usa muitos quês numa mesma frase, diga-se de passagem) Argumento pretensioso, mas que me agradou muito. (Ops, mais um que)

Segundo minha voz interior, isso significa que não gostei tanto assim do resultado. Vozinha chata essa, que não sai da cabeça e não perdoa nenhuma relutância. Eu gostei sim do resultado. In fact, amei! Agora sou uma menina vermelinha, que no sol tem o cabelo da cor de cerejas escuras.

Segundo este texto, isso significa que ainda não decidi como me sinto a respeito dos meus novos cachos vermelhos.

Mas como toda boa indecisa, não usei tinta.

Pedi para a moça do salão usar tonalizante.

Eu sempre dou um jeitinho de voltar atrás!

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Muito nova para morrer

Sempre tive a impressão de que morreria cedo. Ao guardar pequenas coisas em minha gaveta, tinha a sensação de alimentar uma caixinha de Pandora a ser aberta por minha mãe, em uma chorosa tarde de domingo quando eu já não estivesse mais aqui.

Na gaveta, nada muito comprometedor. Uma conta de celular que esqueci de pagar, um maço de cigarros de menta que gostava de fumar aos domingos à tarde, um ticket do restaurante onde fui pela última vez com um namoradinho que estava começando a me encantar de verdade.

Segredos, segredinhos diria agora que a impressão virou realidade.

Eu morri aos 21 anos, logo depois de terminar Dom Casmurro pela terceira vez. Com certeza foi minha obstinação por essa obra prima da psicanálise literária que assinou a minha sentença de morte. “Essa guria já leu Machado de Assis demais para uma encarnação só”, pensou Deus ao enviar a Dona Morte para me buscar.

Confesso que não me surpreendi quando abri os olhos e a vi sentada na poltrona do meu quarto, como quem admira um amante quando este despretenciosamente deixa à mostra o corpo nu.

- Oi.
- Oi.
- Acho que sei quem é você.
- E quem sou eu?
- A Morte.
- Não. Eu sou a Dona Morte, secretária da Morte. Quem me dera ser a Morte! Quisera eu dar fim à vida.
- Tem certeza de que gostaria disso?
- Claro! Você por acaso conhece a Morte para achar que a vida é melhor?
- Não.
- Então não fale com esse tom que me culpa por querer tirar a vida das pessoas.
- Está certo. Como não gosto de falar das coisas sem propriedade, me leve logo. Quero conhecer a tal da Morte.
- Gostei de você, garota! A maioria das pessoas teme a morte. Você, ao contrário, quer conhecê-la para não cometer injustiças aos preferir a vida. Mas sabe, o curioso é que se você conhecer a morte, e mesmo assim preferir a vida, não poderá voltar atrás. O que me diz disso?
- Digo que também é assim com o amor. Depois de conhecê-lo, não há volta. Sobrevivi a ele. Posso sobreviver à Morte.
- Garota, nunca ouvi ninguém falar em sobreviver à Morte.
- É mesmo... Como se possível sair com vida da Morte.
- Eu posso fazer com que você saia com vida da Morte.
- Mesmo? Mas será que eu quero? Você mesma me disse que eu não devia achar a vida melhor que a Morte.
- A vida não é melhor que a Morte, assim como a velhice nunca será melhor que a juventude. É cada coisa à seu tempo...
- E qual é o meu tempo?
- Ele se esgotaria hoje.
- Então a minha impressão...
- Sim, você estava certa.
- Mas porque mudar os planos agora?
- Porque a morte não deve causar curiosidade, mas sim pesar e medo. E para que seja assim, você precisa viver mais alguns anos.

No fundo, sempre tive a impressão de que era muito nova para morrer.