domingo, 30 de dezembro de 2007

Resoluções de ano novo

Eu sei que é muito piegas, mas não consegui resistir e decidi fazer uma lista de metas para 2008. Bem provavelmente não irei cumprir 70% das promessas. Mas vale a intenção de começar o ano com o pé direito, não vale?

Resoluções de ano novo:

1º. Parar de beber como um gambá
2º. Para de me preocupar com assuntos e pessoas pequenas
3º. Passar os cremes receitados pela dermatologista da maneira correta
4º. Usar o aparelho móvel para dormir (sim, eu tenho que usar até os 21 anos)
5º. Deixar o cabelo crescer
6º. Não cair na tentação de fazer luzes no cabelo
7º. Economizar 50% do meu salário
8º. Não ficar segurando o xixi
9º. Comer mais salada
10º. Comer mais frutas
11º. Comer menos doces e guloseimas cancerígenas
12º. Visitar mais a minha vovó Dulce
13º. Sair mais com o meu pai
14º. Sair mais com o meu irmão
15º. Continuar saindo muito com a minha mãe
16º. Ir mais à missa
17º. Ir mais ao salão (leia-se: não deixar as unhas em estado de calamidade)
18º. Dizer mais “sim”
19º. Dizer mais “não”
20º. Dizer mais “eu te amo”
21º. Aceitar as minhas limitações
E por fim,
21º. Ser muito, mas muito feliz, com tudo o que a vida me der!

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Maria e sua lei

“E pelas minhas leis, todo mundo é obrigado a ser feliz”. Depois de pronunciar essas últimas palavras, a princesa Maria foi coroada rainha. Como jornalista mais antigo desta província, acredito que este promete ser um reinado interessante. Isso porque, como otimista que sou, tenho certeza que esta terra será o palco da Utopia, de Thomas More.

Mas há quem diga o contrário. (Sempre há) Este quem se refere a João de Algarves, famoso sociólogo da corte que acredita que muitas pessoas se negarão a ser felizes só para não seguirem a lei.

Será que existem pessoas tão do contra assim? A Utopia de More me sustenta. Vou acreditar que as pessoas preferem ser feliz. Eu, pelo menos, prefiro.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Alguns, por Saulo

Surpresa em forma de texto

Quando menos se espera, aquele colega que você vê todo dia na faculdade se revela um otimo papo. Quando menos se espera, ele vira um amigo. Mais repentinamente ainda ele oferece suas reflexões, formata-as em um texto e generosamente permite que você as coloque em seu blog.

Como ele mesmo escreveu no texto abaixo, as pessoas vivem de acordo com diferentes valores. Eu fico feliz em saber que ele consegue entender a maneira como eu levo a minha. Há uma luz no fim do tunel, finalmente!

Alguns

Dizem que a vida é pra ser vivida intensamente, cada minuto como se fosse o último. Mas por que Diabos existem alguns infelizes que se preocupam tanto com o futuro? Talvez porque sabem que a vida não começa aos 15, muito menos termina aos 25.

Quem dera se eu encarasse a vida da mesma maneira, sem me preocupar com o futuro...vivendo apenas o próximo sábado à noite. Sim, sem dúvida seria bom, maravilhoso. Mas seria eu feliz assim? Sim, pois alguns vivem dessa maneira.

Afinal, qual a melhor maneira de se viver? Formar uma família? Viver sozinho e viajar o mundo? Morar em uma praia, cuidando de um bar. Boa essa, quem sabe um dia.

Na verdade, caros amigos, a vida é uma grande de uma filha da puta: te dá milhares de opções, milhões pra ser mais sincero. Agora cabe à você, campeão, definir a que melhor se encaixa com você.

Alguns são loucos, literalmente loucos, pois nascem em determinado estado, numa determinada família, e querem conquistar o mundo. Esses, meu filho, estão ferrados. Ah, como estão! Quanto mais dificuldades para esses, melhor! São loucos, veneram a dor, a batalha, o desafio e seus limites. Caem muitas vezes, é verdade, mas se divertem também, sem dúvida.

Por vezes, alguns sonham demais. E isso, campeão, não é nada bom não. Viver do amanhã não é bom. Quando isso ocorre, chame amigos, parceiros, bebidas e mulheres. (Um bom paliativo, seu idiota!)

Alguns nascem querendo mudar o mundo, coitados, mandando o senso comum, as generalidades, as mesmas opiniões e as convenções de merdas se foderem. Você pergunta: por quê? Deve ser insano o garoto. Talvez. Quem sabe ele seja.

Alguns não querem viver a vida da mesma maneira que todos, ser apenas mais um. Alguns querem desafiar o mundo e gritar bem alto: “Não, caralho, isso não é assim. Eu não tenho que ser assim e não serei jamais, independente do que os outros pensem ou falem”.

Saulo Roberto

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Coisas a fazer

Eu não vou pro inferno. Eu não vou pro céu também. Mas pra ser sincero, nem quero. Meu lugar ainda é aqui na Terra. Tenho muitos assuntos a resolver.

Primeiro, vou acertar as contas com aquele vizinho filho da puta que deixa os gatos mijarem no pneu do meu carro. Depois, vou dar uma porrada na minha colega de trabalho, aquela filha da puta que tem inveja de mim e não me deixa trabalhar em paz.

Mais tarde, quem sabe uma semana depois, vou cobrar aquele cara que ficou me alugando durante a festa da semana passada. Se não fosse ele, eu teria pegado aquela gostosa que me deu mole. Vou cobrar com juros e correções monetárias as aventuras que não vivi.

Après (como diriam os franceses), vou dar uma volta por ai com meus melhores amigos. Amigos que nos momentos de revolta e perigo estiveram do meu lado. Na seqüência, passarei um tempo com a minha mãe e com meu pai – a dupla dinâmica que paradoxalmente me domina e me deixa ser a pessoa mais livre do mundo.

Minutos antes da morte, vou fazer mais uma coisa: comer um enorme sorvete de limão, cheio de cobertura de chocolate. Um sorvete sempre é uma boa desculpa para um encontro, mesmo que seja um encontro com a morte.

domingo, 2 de dezembro de 2007

Exorcismo

Um padre, pelo amor de Deus. Essa menina precisa ser exorcizada. Está com o demônio no corpo há mais de três meses e nada que pobres mortais façam pode ajudá-la.

Muitas pessoas já tentaram conversar com ela, mas nada parece resolver.

Sem maiores explicações, a possuída sai bebendo todos os copos de vinho a que tem acesso e faz muitas besteiras. Fala o que não quer, faz o que não quer. Isso nos melhores dias.

Há ocasiões em que as coisas ficam realmente feias e a nossa personagem não lembra do que fez. Amnésia alcoólica, como diriam os médicos.

Médicos esses que receitaram para ela o remédio mais eficaz. “Tomar duas pílulas de vergonha na cara, uma pela manhã e outra à noite”.

Remédio amargo, o que torna o tratamento muito penoso. Mas a nossa personagem irá tentar. Ela promete.

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

O Dono Da Razão

Carioca, 23 anos, bombadinho. Aposto que a partir dessa descrição milhares de menininhas se interessariam pelo bofe. Mas garanto: o interesse acabaria assim que elas descobrissem que ele é O Dono Da Razão.

O Dono Da Razão vem de uma tradicional família de lutadores de boxe. Dos avós paternos herdou o sobrenome Dono, e dos maternos Da Razão. Criado pela mãe (uma artista plástica da vanguarda carioca), desde pequeno evita diálogos ou qualquer mostra de civilidade capaz de expandir seus conceitos e a sua visão a respeito da vida.

Na semana passada aprontou mais uma das suas. Chateado com as atitudes de uma amiga, ignorou-a durante toda a noite, sem ao menos perguntar os motivos que a levaram a agir da maneira como agiu. Era de se esperar. Ele é O Dono Da Razão, nada que os outros falem jamais estará certo.

A vida, no entanto, lhe pregou uma peça. Na tarde de ontem O Dono Da Razão descobriu que não vai mais poder treinar boxe porque está com sérios problemas na coluna. Nosso personagem, pela primeira vez na vida, não vai poder contar uma história da maneira como gostaria.

Será que ele aprendeu alguma coisa com isso? Ainda é cedo para saber. Mas eu fico na torcida pelo O Dono Da Razão. Torço para que no futuro ele não precise sofrer tanto para aprender que a razão é apenas uma comodidade, criada pelos homens para explicar e definir coisas que na verdade são tão alógicas e inexplicáveis como a paixão.

A razão é uma construção individual. Eu tenho a minha, você a sua. Mas contraditoriamente, não consigo acreditar que O Dono Da Razão tenha a dele.

domingo, 25 de novembro de 2007

Esse texto é sobre voCê

Esse texto é sobre a sua pele branquinha, que está pronta para ficar morena.

É sobre a sua boca pequena, que está pronta para ser beijada.

É sobre as suas covinhas, que de tão bonitinhas até escondem o seu jeito maluco e briguento.

É sobre a sua perna machucada do futebol, que está pronta para dançar balé mais uma vez.

É sobre a sua mania de falar alto, que está pronta para ser extinguida.

É sobre o seu péssimo hábito de mexer nervosamente a perna, que está pronto para ser analisado pela doutora Kátia.

É sobre a sua saia curtinha, que está pronta para perder mais uns 10 centímetros de pano.

É sobre a sua pulseira de prata, que está pronta para ser polida na joalheria da esquina.

É sobre o seu tênis preto, que está pronto para ser lavado pela primeira vez em seis meses.

É sobre a sua calça jeans, que está pronta para ser aposentada depois de sete anos de uso.

É sobre o seu jeito simpático, que está pronto para se eternizado na minha memória.

É sobre você, um amontoado de sensações e emoções.

É sobre você, que de tão simples é a mais complexa das criaturas.

terça-feira, 20 de novembro de 2007

Brincar de culpar

Não há nada mais divertido do que colocar a culpa nos outros. E Alice sabe se divertir como ninguém.

Ontem, quando acabou com os cubos de gelo das formas, por exemplo, não titubeou nem um segundo ao acusar o irmão da proeza. “Nossa, esse moleque não tem a mínima noção de convívio social”, disse para a mãe, com a cara mais lavada de todas.

Mas não é apenas para passar ilesa às pequenas chatices do dia-a-dia que Alice usa esse maravilhoso e libertador mecanismo. Ela se safa de conflitos morais capazes de deixar Aristóteles sem resposta.

Na semana passada, quando atropelou uma velhinha que andava tranqüilamente na calçada, não sentiu o menor peso na consciência e gritou: “quem mandou andar devagar, sua velha senil”.

Até aí, tudo bem. Ela transfere sua culpa aos outros apenas para se sentir melhor. A coisa fica realmente feia quando ela faz os outros se sentirem culpados por tudo o que lhe acontece.

Por isso, Alice, escute bem o que vou dizer:

Brincar com a verdade é engraçado. Brincar de culpar os outros também é engraçado. Fazer os outros se sentirem culpados é triste. Assumir a culpa pode ser a única alegria para aquele que está do outro lado da brincadeira.

terça-feira, 13 de novembro de 2007

Manias

As manias são altamente esclarecedoras. Perigosamente esclarecedoras, eu diria. Por meio delas, pode-se dizer muito sobre uma pessoa. Talvez até mais do que uma sessão de hipnose.

O que será que as minhas dizem a meu respeito?

Formulei algumas hipóteses:

Mania: deixar a toalha em cima da cama
Significado: sou folgada, deixo tudo para minha mãe fazer

Mania: tomar yogurt como se fosse mamadeira
Significado: sou uma criança de 20 anos, pouco disposta a abandonar antigos hábitos

Mania: passar xampu três vezes quando lavo o cabelo
Significado: gosto de múltiplos de três

Mania: dormir com o travesseiro em cima da cabeça (isso mesmo: ao invés de apoiar minha cabeça no travesseiro, coloco ele por cima)
Significado: tenho medo de monstros e acho que o travesseiro pode me proteger à noite

Mania: combinar meias e calcinhas
Significado: Não sei relaxar e aceitar coisas fora do padrão

Mania: comer andando
Significado: não tenho tempo nem para comer

Mania: comprar bolsas (no momento, tenho 36)
Significado: colega, nem eu arrisco um palpite

Mania: falar e escrever o que me vem à minha cabeça, sem pensar antes
Significado: tenho a impressão que vou conseguir arrumar os estragos que a minha caneta e a minha boca fazem

Para conhecer as nossas manias, demoramos anos. Em 20 anos, consegui detectar e interpretar algumas. Mas o melhor dessa história é saber que novas manias irão surgir, assim como outras irão ficar pelo caminho.

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Meu Fusca

Eu amo o meu Fusca. Amo com um amor inexplicável, inconfundível. Antigamente, um amor perturbador. Cada vez que o carro inventava de empacar em uma rua ou ladeira, tirava o meu sono, a minha calma. Agora sinto um amor tranqüilo, sereno, prazeroso.

Não ando mais com meu Fusca pela rua. O deixo na garagem por vários motivos. Da primeira vez, confesso, estava cansada de tentar arrumar o motor do carro. Mas ontem, depois de uma tarde ensolarada no parque, vi as coisas de outra forma.

Descobri que o deixo na garagem porque é muito precioso, uma verdadeira relíquia. O deixo lá porque sei que é o único carro cujo assento encaixa perfeitamente no meu bumbum. O deixo lá porque sei que se quebrasse na rua, jamais me recuperaria da perda.

Prefiro andar com ele de vez em quando, em ruas calmas e bem asfaltadas. Polir sua lataria com a melhor cera e com os mais belos elogios, para que nos dias em que a gente saia junto seja tudo perfeito. Tenho certeza que se conservar o meu Fusca, iremos passear juntos para sempre.

Ele até pode deixar de ser o carro que me acompanha todos os dias, mas jamais deixará de ser o carro que mais marcou meu coração. Ele pode deixar de ser o carro para quem eu guardo meus beijos e carinhos, mas jamais deixará de ser o carro em quem eu confio nos momentos difíceis.

Como ontem à tarde, quando cansada de andar rápido e por estradas cheias de buraco o tirei da garagem e o levei ao parque.

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Tentação

A sensação de que estou sendo tentada é constante. Não sei se é mania de perseguição, mas é só pensar “não quero beber” que aparece uma propaganda de cerveja na tela da TV. Tento fugir, ligo o rádio. Maldição! Está tocando Elza Soares e sua pérola “Eu bebo sim e estou vivendo, tem gente que não bebe e está morrendo”.

Desligo o rádio. Decido me internar no MSN. Ali, se eu não puxar nenhuma conversa sobre o assunto não corro maiores riscos. Ledo engano. Basta entrar que aparece na tela do computador uma mensagem do D., amigo de longa data. “Vamos num barzinho hoje à noite”, pergunta.

Ai meu Deus! Recusar um convite do D. é como dizer não a mim mesma, tamanha a consideração que sinto por ele. Relutante, aceito o convite. “Mas com uma condição: hoje não vou beber”, digo para mim mesma.

Chego ao bar. O ambiente convida ao pecado, obviamente. Sento à mesa e olho o cardápio. Pulo a parte das bebidas, ou seja, me restrinjo à ultima página, onde ficam os sucos e as águas.

Triste fim de Cecília Quaresma. Não, não posso permitir uma situação como essa! Como ficaria papai se me visse assim, negando um copo de cervejinha? Papai jamais me perdoaria por tamanha fraqueza. Mas não seria eu uma fraca por não resistir ao copinho de cerveja?

Parando para pensar, sou muito forte. Já se passaram dois minutos e eu ainda não toquei no copo gelado de cerveja que o D. pediu ao garçom. Tudo bem, o copo é dele, mas se eu realmente quisesse um gole isso não me impediria. Eu e o D. somos unha e carne, mesmo quando passamos meses sem nos ver. Assim, considero que o que é meu é dele e o que é dele é meu!

Nossa, formulei um raciocínio sobre a minha amizade com D.! Pensei em outra coisa que não cerveja. Um progresso: parabéns para mim!

Certo ou errado?

Há dias em que os dias parecem tão certos...
Há dias em que os dias são realmente certos
Há dias em que eu tenho certeza
Que a unica certeza
É a incerteza de estar certa
Certo?

domingo, 4 de novembro de 2007

Um amigo de volta*

O retorno de um amigo é realmente um retorno. É uma volta ao exato momento em que nós o vemos pela última vez, independente do tempo e da distância que até ontem impediam as cervejinhas dos finais de semana.

O retorno de um amigo é pertencer novamente. Pertencer a um universo familiar, seguro, confortável. E nada melhor do que perceber que o seu olhar, ao cruzar com o dele, ainda consegue trocar idéias como que por telepatia.

É rir de piadas que fizeram falta, já que nada tinham de engraçadas aos olhos dos outros. É lembrar das situações mais horríveis e traumáticas (“lembra aquela vez que seu pai estava bêbado e brigou na frente de todo mundo”, recorda o amigo) e dar risada até a barriga doer.

É se sentir à vontade para falar a verdade. Sem pensar duas vezes, você sabe que pode abrir o coração e despejar de lá de dentro as histórias mais cabeludas que aconteceram nos últimos meses. Nada de culpa, medo ou vergonha.

É estar quieta e sentir um soco no rim, seguido de uma risada irritantemente provocadora. E é feliz de ter recebido esse soco, a mais verdadeira demonstração de carinho que o amigo pode dar. (Você que o conhece bem sabe que um beijo para ele não é nada, mas um soco no rim significa eu realmente gosto da sua companhia)

É poder sair de casa se sentindo em casa, porque com o amigo todo lugar é aconchegante como a churrasqueira de traz da casa da praia do avô.

É estar viva de novo. É estar feliz por estar viva.

*para Heitor, Core, Torto, Toi
(Que bom que você está aqui!)

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Eu e eu

Quando comprei o livro Amor é Prosa, Sexo é Poesia, do Arnaldo Jabor, eu achava que sabia alguma coisa da vida. Hoje penso: “coitada de mim”.

Okey, eu sabia resolver uma equação do segundo grau e também sabia qual era o filo da Angustifólias paranaenses. (Conhecimentos inúteis para alguém como eu, concorda?) Mas sabia eu coisas que realmente importam? Hoje vejo que não.

Não fazia idéia, por exemplo, do quanto a vida pode ser complexa.

Não fazia idéia do que é acordar querendo beijar uma paixão antiga e dormir completamente encantada pelo menino que gentilmente me ajudou a chamar o garçom.

Não sabia que as decisões mais difíceis devem ser tomadas espontaneamente, caso contrário nunca serão tomadas.

Também jamais imaginei que poderia ver duas, três, quatro, cinco, um milhão de coisas diferentes em uma mesmo situação, apenas mudando o ângulo do meu olhar. E nunca havia enxergado nisso a verdadeira graça da vida, o que continua me instigando a ter alguma relação com o mundo.

Naquela época era uma menina de 16 anos. Hoje sou uma menina de 20 anos. Aparentemente pouco mudou, a não ser pelo novo corte de cabelo que decidi adotar semana passada. Por dentro, no entanto, tudo está diferente. Muitas coisas fazem sentido. Coisas das quais, mais nova, nem tinha consciência.

Aí está a graça de visitar o passado de vez em quando. Poder comparar duas pessoas – o eu e o eu. Mas acho melhor voltar ao presente, antes que o meu antigo eu venha me assombrar com suas dúvidas e melancolias adolescentes.

quarta-feira, 31 de outubro de 2007

De vazio, já basta o outro lugar da mesa

Terça-feira, seis e meia da tarde. Dia e horário ideal para um happy hour. Sentada à mesa do bar, esperava o garçom trazer o cardápio. Quando o garçom chegou, fez a pergunta indiscreta: “é só você?”. A garota, constrangida, respondeu: “sim, acredito que por enquanto seja só eu”.

Mal sabia o mero servente que o por enquanto era sinônimo de tempo indeterminado. Tempo determinado, na verdade, pelo garoto que dominava aquele coração. Ele era amor antigo, mas nem por isso menos arrebatador.

Arrebatava toda a sua energia, a sua sanidade mental. Arrebatou também seu senso de ridículo. Afinal, quem senta sozinha numa mesa de bar para esperar por alguém que não vai chegar?

Consciente do quanto parecia patética naquela mesa, ela olhou para o garçom, que àquela altura do campeonato havia se transformado no príncipe do cavalo branco. Ele serviu mais uma taça de vinho, ao que ela imediatamente falou: “não quer tomar comigo?”.

Constrangido, ele disse que não podia beber em serviço. Rejeitada até pelo garçom, ela lembrou de uma frase que havia ouvido de um grande amigo há algumas semanas. “Se você sorrir por 10 segundos, não há homem que não caia aos seus pés”, disse ele.

Acanhada, mexeu alguns músculos no canto da boca. Sim, aquela careta era o esboço de um sorriso. Se sentiu ridícula. Realmente estava sendo ridícula. Decidiu pedir a conta. Sorrir para todos e para ninguém é o que há de mais vazio. E de vazio, bastava o outro lugar da mesa.

domingo, 28 de outubro de 2007

Mudando de gênero

Eu admiro os homens. Admiro esse gênero da humanidade mais do que tudo. Não, na verdade não admiro. Vou mais longe: sinto inveja.

Invejo a capacidade que tem de ficar horas conversando com os amigos sem dizer nada de útil. Estão certo, nem tudo na vida tem que ter uma utilidade. (Caso contrário, como explicaríamos a existência de algumas pessoas nesse mundo?)

Invejo a habilidade com que fazem piadas a respeito dos assuntos mais sérios dessa vida. Um exemplar do gênero, ao conversar com os amigos sobre uma das brigas que teve com a esposa, resumiu tudo em uma pequena anedota. “Quando ela começou a dizer que não dava mais para continuarmos casados, olhei bem nos olhos dela e falei: ‘tudo bem’. Peguei as duas malas que estavam dentro do armário embutido, coloquei-as em cima da cama e a enchi de roupas. As roupas dela, lógico. Ela tava louca se achou que eu é que ia sair”, contou, em meio a intermináveis gargalhadas.

Invejo o jeito leve e simples com que encaram desde o problema mais rotineiro até o maior dilema de todos. Não são como as mulheres, que se prendem em pequenos detalhes inexistentes e se tornam incapazes de entender o raciocínio mais lógico e infalível de todos: ou é, ou não é.

Invejo também a maneira exata como suas vontades e desejos funcionam. Eles não misturam sexo com sentimento. (No que fazem muito bem, diga-se de passagem). Para esse gênero da espécie humana, amor é sentimento e sexo é prazer. E é dessa forma que arranjam seus relacionamentos. Não se desgastam pensando: “o que será que significa o sexo de ontem”. Segundo a lógica dos homens, sexo não tem significado. Sexo é sexo, ponto.

Mas acima de tudo invejo a maneira sincera com que se entregam à vida. Se querem beber, bebem. Se querem comer, comem. Se querem sexo, fazem sexo. Se querem namorar, namoram. E não ficam se enganando ou arranjando desculpas para as atitudes que tomaram. Se alguém fizer a mais infame das perguntas, têm a resposta na ponta da língua. Dizem: “porque eu quis”.

Daqui em diante, serei um homem. Um homem de voz fina, unhas pintadas, brincos de borboleta, anel de brilhante no dedo da mão direita e sapatinho de boneca vermelho. E sabe por quê? Porque eu quero!

segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Modalidades

Mesmo cheia de coisas para fazer, ela não conseguia tirar da cabeça o raciocínio revelado na noite anterior pelo seu mais novo amigo. Tão inusitado quanto obvio, se é que isso é possível, o pensamento do amigo lhe prendeu a atenção exatamente por reunir essas avessas características.

Para o amigo, os beijos, os carinhos e todo o resto, que por uma questão de respeito à moral e aos bons costumes não vou descrever aqui, podem e devem ser categorizados. Há aqueles que são mornos e chochos. Na outra ponta, os que nos arrebatam inesperadamente e de maneira incontrolável numa noite de domingo que tinha tudo para ser apenas mais uma chata noite de domingo.

“Mas não será errado categorizar as situações que vivemos, já que cada uma tem um valor único e especial?”, se perguntava a menina. Depois de gastar horas com esse infrutífero dilema, decidiu categorizar algumas situações porque passara nos últimos anos.

Lembrou do seu primeiro beijo. “Foi melhor ou pior que o último?”, questionou. Puxa vida! De todas as situações que poderia ter escolhido lembrou justo desta? Justo de dois momentos tão diferentes e ao mesmo tempo tão similares em suas essências?

Mas foi em frente. Escreveu num papel tudo o que lembrava das duas situações. O primeiro beijo, adjetivou-o como mágico, instintivo, inexplicável, estranho. Para o último restaram adjetivos menos puros e abstratos, mas nem por isso menores.

Ao se dar conta de que não existem adjetivos menores, viu também que não existem modalidades ou categorias menores, apenas diferentes. Se sentiu estranha, meio desarmada. Ela, que nem queria criar modalidades para nada, se viu desprovida de uma idéia a que já estava apegada.

Respirou fundo e, num impaciente rompante, decidiu criar um final para mais essa viagem mental. Decidiu, muito decidida, que ao invés de criar modalidades para aquilo que já viveu, iria viver todas as modalidades. Escolheu o caminho mais simples, o caminho mais divertido.

sábado, 20 de outubro de 2007

Eu, uma menina veneno?

Nada melhor do que uma sonequinha depois do almoço. Alguns chamam de cesta, mas eu e minha mãe chamamos de sonequinha depois do almoço. Bom, lá estava eu deitada no sofá da sala, com o rosto já marcado pelas dobras do sofá, com um ouvido no mundo dos sonhos e o outro no mundo dos acordados.

Eu estava indo de encontro àquele milésimo de segundo em que a gente escolhe se vai entrar no sono profundo e aproveitar a rara oportunidade de colocar o sono em dia ou se vai continuar acordada, pensando em tudo e em nada ao mesmo tempo.

Como o ser humano hiperativo que sou, escolhi a segunda opção. Não sei porque, mas me parece impossível dormir de tarde. E olha que já tentei várias vezes. Mas continuando o raciocínio: naquele milésimo de segundo em que escolhi ficar acordada ouvi um som vindo da cozinha. Era o rádio da Ângela, moça que trabalha aqui em casa. Sintonizado em uma AM qualquer, as ondas sonoras do aparelho propagavam a música “Menina Veneno”, do Ritchie.

Ah, vai dizer que você não sabe que música é essa? Claro que sabe! Mas só para refrescar a memória, vou cantar um pedacinho: “menina veneno, o mundo é pequeno demais pra nós dois”. Lembrou? Que bom, melhor assim!

Ao ouvir essa belíssima letra não pude evitar e fui carregada para mais uma das minhas longas viagens mentais. Me peguei pensando: que tipo de veneno eu gostaria de ser? Do além, lembrei da letra do Raul Seixas e do seu desejo de ser uma metamorfose ambulante.

Pronto, respondida a questão: quero ser um veneno mutante. Um veneno que se adapte ao gosto do freguês. Se o envenenadado em questão for um homem inconsolado, quero ser um veneno doce, inebriante. Se for uma velha senhora desamparada, um veneno que lembre o gosto de sua infância. Se for um jovem conquistador, o veneno mais apimentado de todos.

Depois de definir que seria um veneno mutante, parei para pensar se deveria mesmo ser um veneno. Não seria melhor ser alguma outra coisa, algo menos nocivo? Essa pergunta me tirou qualquer chance de continuar minha sonequinha. E olha, até agora nada de resposta.

quinta-feira, 18 de outubro de 2007


Para inaugurar esse blog, nada melhor do que uma descrição de quem aqui escreverá tantas palavras. Como ainda não consigo falar sobre mim com a facilidade com que tagarelo sobre qualquer outro assunto, empresto a descrição de outro autor. Sei que não foi escrita para mim, mas ao ler não consigo evitar a pergunta: "será?".


Ser Brotinho


Paulo Mendes Campos


Ser brotinho não é viver em um píncaro azulado: é muito mais! Ser brotinho é sorrir bastante dos homens e rir interminavelmente das mulheres, rir como se o ridículo, visível ou invisível, provocasse uma tosse de riso irresistível.


Ser brotinho é não usar pintura alguma, às vezes, e ficar de cara lambida, os cabelos desarrumados como se ventasse forte, o corpo todo apagado dentro de um vestido tão de propósito sem graça, mas lançando fogo pelos olhos. Ser brotinho é lançar fogo pelos olhos.


É viver a tarde inteira, em uma atitude esquemática, a contemplar o teto, só para poder contar depois que ficou a tarde inteira olhando para cima, sem pensar em nada. É passar um dia todo descalça no apartamento da amiga comendo comida de lata e cortar o dedo. Ser brotinho é ainda possuir vitrola própria e perambular pelas ruas do bairro com um ar sonso-vagaroso, abraçada a uma porção de elepês coloridos. É dizer a palavra feia precisamente no instante em que essa palavra se faz imprescindível e tão inteligente e natural. É também falar legal e bárbaro com um timbre tão por cima das vãs agitações humanas, uma inflexão tão certa de que tudo neste mundo passa depressa e não tem a menor importância.


Ser brotinho é poder usar óculos como se fosse enfeite, como um adjetivo para o rosto e para o espírito. É esvaziar o sentido das coisas que transbordam de sentido, mas é também dar sentido de repente ao vácuo absoluto. É aguardar com paciência e frieza o momento exato de vingar-se da má amiga. É ter a bolsa cheia de pedacinhos de papel, recados que os anacolutos tornam misteriosos, anotações criptográficas sobre o tributo da natureza feminina, uma cédula de dois cruzeiros com uma sentença hermética escrita a batom, toda uma biografia esparsa que pode ser atirada de súbito ao vento que passa. Ser brotinho é a inclinação do momento.


É telefonar muito, estendida no chão. É querer ser rapaz de vez em quando só para vaguear sozinha de madrugada pelas ruas da cidade. Achar muito bonito um homem muito feio; achar tão simpática uma senhora tão antipática. É fumar quase um maço de cigarros na sacada do apartamento, pensando coisas brancas, pretas, vermelhas, amarelas.


Ser brotinho é comparar o amigo do pai a um pincel de barba, e a gente vai ver está certo: o amigo do pai parece um pincel de barba. É sentir uma vontade doida de tomar banho de mar de noite e sem roupa, completamente. É ficar eufórica à vista de uma cascata. Falar inglês sem saber verbos irregulares. É ter comprado na feira um vestidinho gozado e bacanérrimo.


É ainda ser brotinho chegar em casa ensopada de chuva, úmida camélia, e dizer para a mãe que veio andando devagar para molhar-se mais. É ter saído um dia com uma rosa vermelha na mão, e todo mundo pensou com piedade que ela era uma louca varrida. É ir sempre ao cinema mas com um jeito de quem não espera mais nada desta vida. É ter uma vez bebido dois gins, quatro uísques, cinco taças de champanha e uma de cinzano sem sentir nada, mas ter outra vez bebido só um cálice de vinho do Porto e ter dado um vexame modelo grande. É o dom de falar sobre futebol e política como se o presente fosse passado, e vice-versa.


Ser brotinho é atravessar de ponta a ponta o salão da festa com uma indiferença mortal pelas mulheres presentes e ausentes. Ter estudado ballet e desistido, apesar de tantos telefonemas de Madame Saint-Quentin. Ter trazido para casa um gatinho magro que miava de fome e ter aberto uma lata de salmão para o coitado. Mas o bichinho comeu o salmão e morreu. É ficar pasmada no escuro da varanda sem contar para ninguém a miserável traição. Amanhecer chorando, anoitecer dançando. É manter o ritmo na melodia dissonante. Usar o mais caro perfume de blusa grossa e blue-jeans. Ter horror de gente morta, ladrão dentro de casa, fantasmas e baratas. Ter compaixão de um só mendigo entre todos os outros mendigos da Terra. Permanecer apaixonada a eternidade de um mês por um violinista estrangeiro de quinta ordem. Eventualmente, ser brotinho é como se não fosse, sentindo-se quase a cair do galho, de tão amadurecida em todo o seu ser. É fazer marcação cerrada sobre a presunção incomensurável dos homens. Tomar uma pose, ora de soneto moderno, ora de minueto, sem que se dissipe a unidade essencial. É policiar parentes, amigos, mestres e mestras com um ar songamonga de quem nada vê, nada ouve, nada fala.Ser brotinho é adorar. Adorar o impossível. Ser brotinho é detestar. Detestar o possível. É acordar ao meio-dia com uma cara horrível, comer somente e lentamente uma fruta meio verde, e ficar de pijama telefonando até a hora do jantar, e não jantar, e ir devorar um sanduíche americano na esquina, tão estranha é a vida sobre a Terra.